Wednesday, February 28, 2007

Achei hoje nos meus guardados.

De fogo branco

A brancura do papel na máquina chegava à ser implacável. Uma folha em branco colocada num ímpeto e que se quedava ansiosa, curiosa do seu destino. E talvez até mesmo ávida como uma virgem que levou tempo demais até se decidir. O papel começou à ser ao mesmo tempo o sujeito e o objeto. Como se fosse um assunto predileto. Mas não era.

Haviam tantos outros que poderiam cobrí-lo, como num ato de amor, de fé, ou mesmo com a força de um trovão um ato de ira há muito contida. Mas as palavras insistiam em se formar no sentido único de cobrir o papel, bem formuladas talvez, mas relutantes em sair do que estava se tornando um círculo vicioso. Quem sabe uma elipse viciosa, pois pressentia-se a possibilidade de novos temas. Não adianta querer me abandonar. Nem mesmo ficar tão apaixonada, que nada. Mistério sempre há de pintar por aí...

_Por que não escrever sobre ela?
_A folha em branco?
_Não. Sobre ela. Ela, aquela moça de fogo.

A moça de fogo era um tema bastante para cobrir muitas páginas em branco. E para ser coberta em muitas noites em branco. Mas resistia, como se fosse queimar o papel ao ser descrita, falada, assumida ou amada na folha em branco, que (já meio coberta) saracoteava pra cá e pra lá, de linha em linha.

_Por que não escrever sobre ela?
_A folha em branco?
_Não. Sobre a moça de fogo.
_Mas se até já escreví.
_Pouco. É preciso escrever mais. Pelo menos até chegar ao final da folha em branco. E preto.

O espaço era grande demais e mínimo para se contar mais sobre a moça de fogo que iluminava os dias azuis e as noites em branco. Não era possível sequer fazer uma boa descrição dos seus longos cabelos que não eram de fogo. De sua boca quente, cálida nas palavras e no amor. De seus olhos de uma divindade demoníaca. De uma candura angelical quando lançava chamas como um dragão mitológico. Como em tão pouco espaço, e ainda tanto, explicar o som infantil de sua voz de mulher de muita vivencia, que adquiria por vezes modulações da maior gravidade. Como resumir em muitas palavras o corpo de fogo da moça. Como fazer entender que o corpo de fogo ficava frio em certas noites frias ou quentes. Frio como só a moça de fogo sabia transmitir quando decidia. É tao fácil e tão difícil escrever sobre a moça de fogo.

_Por que não escrever mais sobre ela?
_A moça de fogo?
_Ou a folha em branco.
_Porque acabou. Acabou o branco. Ficou uma vaga sensação de frio calor.

(escrito em uma folha, numa noite de dor de corno em 1977, ouvindo “Doces Bárbaros”.)

Tuesday, February 27, 2007

Viva o vIRCio!

Quem me ligou em internet foi o meu velho amigo Ceninho. Tipo em dezembro de 1995 ele me falou que dava pra bater papo teclando direto, e que sairia muito mais barato do que ligações internacionais Brasil-USA. Em janeiro de 1996 eu comprei meu HP e fiquei deslumbrado. Calouro, gastei uma fortuna porque assinei AOL, Compuserve, e mais um outro provedor cujo nome esquecí mas na certa já foi absorvido. Era para “testar” o melhor. No começo eu achava um barato o “You have mail” do American Online, mas em poucos dias me deu nos nervos.

Bem, ele disse que era para eu baixar um programa chamado mIRC e entrar no canal #Brasil da Undernet. Confesso que achei “undernet” extremamente “undigrudi” e atraente. Baixei o tal programa, e entrei no tal canal. Só não achei o Ceninho. Antes tinha que escolher um nick e escolhí TouchDown só pra ver se tinha muita gente que saberia o seu significado. Naquela época não tinha mesmo. Eu ví foi uma lista de nicks, alguns com um @ na frente e outros não. Achei legal a arrôba e tentei usar uma mas o sistema não aceitou. Pouco depois fui informado de que a @ indicava quem era OP do canal. Hmmm... OP... operador. Tudo bem.

Fui batendo papo e de repente começaram à aparecer umas janelas com DCC escritas nelas, para eu aceitar ou não. Fiquei sabendo que eram papos particulares. Tudo bem. Muita gente me ajudou a navegar pelo sistema. Naquela época a ESPN só passava em português para quem assinava TVA e mesmo assim só a tecla SAP. Eu era apenas um cara perfeitamente desconhecido, que morava nos Estados Unidos e estava querendo bater papo com brasileiros.

Me convidaram para entrar no canal #Rio. Eu fui. Tinha muito menos gente e logo fiz amigos: PetroVisk, BMW-RJ, NewLennon e outros. Tinha um @Nietzsche que não falava nada. Eu esperava que ele ao menos dissesse coisas tipo “Um par de óculos poderosos basta às vezes para curar uma pessoa apaixonada”, ou outras pérolas do filósofo alemão. Mas este Nietzsche não era nem filósofo, nem alemão, e nem sequer uma pessoa. Era o “bot” do canal. Um programa apenas para reservar e proteger o canal de ataques. Mas o #Rio não era registrado na undernet que tinha os seus próprios bots (vem de “robot”), o X e o W. Depois dispensaram o W e o X está lá até hoje.

O mIRC passou à ser meu programa predileto. Era maravilhoso chegar em casa e ficar de papo até altas horas. Era o “vIRCio”. Fiz amizades que duram até hoje, e algumas vão durar o resto da vida com certeza. Muitos desapareceram por outros caminhos. Um dia fui banido do canal por um op porque sem querer eu fiz um “flood”. Errei um comando e as linhas se repetiram várias vezes na janela do canal. Eu fiquei ofendidíssimo e falei em pvt com o @^Ghost que imediatamente me desbaniu. Mesmo assim continuei ofendido e disse que não voltava mais lá. Bem, durou até de noite quando o @Goncalves que era 499 do canal (tipo um vice-presidente) me convidou e insistiu que eu voltasse como... op! Surgia o @TouchDown. Mais tarde eu fundaria o #Brasil-USA com uma outra filosofia. Mas isto fica para outro dia!

/msg X@channels.undernet.org login touchdown senha

:)

Monday, February 26, 2007

Eu sempre gostei de brincar com colagens…

Talvez porque elas tenham um aspecto atemporal e são multidimensionais como a própria vida. Talvez pela revelação trazida pelos contrastes. Até este blog está sendo escrito como uma colagem.

Claro que a informação numa sequencia lógica torna-se mais fácil para uma rápida absorção. E digestão. Mas quando a gente quer dar o balanço de um dia, qualquer dia, é uma colagem que aparece na mente. A gente mistura a vitória do Flamengo sobre o Vasco por pênaltis com o Oscar do Martin Scorsese. A apreensão de notas faltas em Brasília com a doença do presidente do Iraque. A limada do Aron Brooks do Oakland Raiders com o update do Mozilla. O MSN com o Orkut, o Fotolog com o Blog.

Eu curtia muito fazer colagem com objetos nos anos 60. Lembro que a grande figura de Milton Tierry, conhecido nos meios do cinema e nos da gandaia cariocas, era um dos admiradores das minhas colagens. Não sobrou nenhuma e hoje nem sei se seriam boas. De qualquer modo sempre redimensionavam o momento.

Mas eu sempre curtí fazer colagem com fotos. Na era pré-digital era a melhor maneira de ver um bocado de fotos juntas em exposição. E para mim sempre foi também uma maneira de ter a presença de família e amigos por perto quando eu já estava morando longe. Comecei cobrindo a porta do estúdiozinho onde morei por 10 anos em Greenwich Village. E cheguei ao auge quando a garagem da minha casa em Bristol estava com todas as paredes práticamente cobertas com colagens.


Era uma coisa legal chegar em casa e ver. Parecia que de certo modo eu tinha os amigos me esperando. Os olhos batiam num e noutro. Cada vez um momento registrado com alguém que eu gosto. Momentos em várias cidades por onde já passei ou viví. E também uma forma de ter o Brasil em casa. O meu Brasil. O Brasil que está sempre comigo onde quer que eu esteja.



(da esq. p dir, entre Reginaldo Faria e Paulo José no Rio, em frente à posters do Cloud 9 (uma peça que acebi dirigindo no Brasil) no Soho, de cabeça rapada ao lado de Pedro Carlos Rovai no Rio, entre Natália do Vale e Carmen Lúcia no meu apêzim de NYC, com a Beatriz Schiller, que era correspondente do JB em Nova York e a Betty Farias numa festa na casa da Laurita Mourão, Maria Zilda Bethlem lá em casa no Village, Simone me visitando lá no Village também, com a querida e saudosa Sandra Bréa, com a Maria Pompeu (tudo lá na 8th Street), levantando meu sobrinho Marcio no Central Park (hoje não daria mais pra isto!), e cantando no Bar Five Oaks no Village.)

A única coisa chata foi que quando eu tive que desmontar estes quadros algumas fotos se ferraram, mas os momentos não serão esquecidos. (da esq. p dir, Redi e Eduardo Conde no Hotel Saint André des Arts em Paris (1979), com a Berenice que me ajudou a descolar o apêzinho da Rua 8, com o meu sobrinho Marcio em frente ao Edifício Dakota em NY, Joãozinho Trinta (que apareceu lá em casa uma vez com o Mauricio Sherman), Marilda Pedroso (é... o estudiozinho tinha até uma lareira), Ney Matogrosso na noite da minha festa de despedida em 78, quando eu morava no Leblon, eu - magrinho ainda- em frente ao Hotel Tropical, em Manaus, e Carmen Lúcia com a minha sobrinha Patrícia e no fundo o meu irmão Thomas e eu no apê da Carmen em NY em 1981, acho.)



E só este texto com estas lembranças já redimensiona, como colagem, esta manhã chuvosa e cinza em Budapeste, quando até meu cachorro Joe Montana está com preguiça de brincar...

Thursday, February 22, 2007

Tenho pensado muito no Redi.

Este mês fez 3 anos que meu amigo amigo Sylvio Redinger morreu. Meu amigo e de muito mais pessoas que o próprio Redi acreditaria. Acho que ele nunca acreditou na própria importância. Redi era o tipo da pessoa que quem quer o tenha conhecido tem certamente “uma do Redi” para contar. Ele mesmo era um contador de histórias.

Nós tivemos muitas. Conhecí o Redi na Sincro Filmes, do Pedro Carlos Rovai. Claro que já o conhecia pelos seus cartuns em “O Pasquim”, e era seu leitor fiel nas tiras da “Última Hora”. Mas a gente estava lá para um mesmo projeto de marketing: lançamento do filme “Eu dou o que ela gosta”, do Braz Chediak. Ele fez a animação e eu fiz um comercial. Fomos com a cara um do outro de cara.

Por coincidência, o irmão dele Luiz tinha uma agência de propaganda na rua onde eu morava no Leblon, a José Linhares. Volta e meia nos esbarrávamos e tomavamos um cafézinho no Bracarense. Nesta época ninguém imaginaria que o Bracarense um dia seria um “point”. Era apenas o meu botequim da esquina onde eu comprava cigarros e tomava cafézinho.

Com o tempo, o cafézinho passou à ser lá em casa. E surgiram mais projetos de lançamentos de filmes (conhecidos pelos outros como pornochanchadas). A gente bolava junto as campanhas, os avant-trailers em animação. Claro, era pura sacanagem! Como por exemplo o avant-trailer para um filme chamado “O Homem da Cabeça de Ouro”, onde se ouvia um monte de vozes femininas gemendo pelo “homem” e a camera ia subindo num desenho de um homem esbelto de paletó e gravata enquanto a locução dizia algo tipo: “O que será que este homem tinha na cabeça para atrair tanto à mulheres?” até que a panorâmica chegava na cabeça sorridente e o penteado parecia uma glande dourada. Pois é. Saiu comentário escandalizado no JB, mas a gente se divertiu e garantiu o cafézinho nosso de cada dia.

Fizemos várias promoções de filmes nesta época. Pagos pelos produtores, ou contratado pelo próprio Luiz Severiano Ribeiro Neto que era o principal exibidor. “Loucuras de um sedutor”, “Com um grilo na cama” (neste eu fiz a risadinha sacana do grilo), e tantos outros. Mas o melhor eram os papos. Redi sabia rir de si mesmo. Viramos amigos de família.


Chegamos à escrever um roteiro juntos. Era um filme que eu iria dirigir e ele faria o papel principal. Tenho certeza que o teria feito bem. Mas como estava demorando para conseguir produção, e como me chamaram para São Paulo para dirigir um filme que o meu amigo Lenine Otoni havia começado mas teve que parar depois de cinco dias devido à sérios problemas intestinais (coisa que mais tarde eu entendi...), filmei “Nem as Enfermeiras Escapam”, e o Redi fez a animação de abertura e o cartaz.

Dois anos depois eu fui para Paris. Eu estava récem divorciado e com a cuca ferrada precisando de alguma coisa. Ficamos nos correspondendo. Isto foi dando uma vontade muito grande nele para ir dar um tempo em Paris também. Dei uma voltadinha de um mês para vender umas coisas e cuidar de assuntos familiares e logo 10 dias depois da minha volta à Paris chegou o Redi.

Caímos um tempo num apêzinho na Rue Mouffetard, num dos cantinhos mais gostosos do Quartier Latin, mas eu só tinha mesmo o apê pelos poucos dias em que um amigo francês estava fora da cidade. Redi tinha um parente, um tio creio, que morava na Mairie de Lilás num subúrbio parisiense. Mas o tio tinha um cachorro que não ia muito com a cara do Redi (e segundo ele, com a de ninguém). Por mais que o tio dissesse que o Redi era “ami”, o cachorro não fazia amizade. O Redi falava do cão com pavor e eu dava risadas, o que felizmente não o incomodava.

Eu falo (ou falava?) um francês razoável. E naturalmente sempre nas lojas e restaurantes era eu quem falava. Mas teve esta tarde, (eu lembro bem porque a gente tinha caminhado muito no Jardim das Tulherias, e eu estava cantarolando direto “sou brasileiro, estatura mediana, gosto muito de fulana, mas sicrana é o meu amor”, quase ao ponto de deixar o Redi irritado) que o Redi quis dar uma parada na farmácia pra comprar shampoo para cabelos oleosos. Eu ia pedir, mas ele insistiu que queria pedir ele mesmo. E soltou em bom som, com o mais perfeito sotaque do Leme: “Monsieur, je bisoin de shampoo pour cheval gras!”. Todo mundo na farmácia caiu na gargalhada e o Redi olhou para mim sem entender porque, até que eu disse para ele que ele havia pedido shampoo para cavalo gordo!

Poucas semanas depois eu saquei que não ia dar pra ficar em Paris (não tinha tios lá com ou sem cachorros) e me mandei para Nova York. Tipo umas 3 semanas depois o Redi baixou lá. Eu já estava com um quarto alugado, e catando uma vaga para estudar no The Actors e Directors Lab. O Redi veio passar uns dias antes de voltar para o Brasil. Na mala tinha um saco de feijão branco que o tio tinha mandado para a mãe. Bem, fizemos uma deliciosa feijoada branca e ainda sobrou para ele levar para a mãe dele, a querida Dona Tósia. (foto: Minha mãe e o Redi em NY, 1980)

Redi voltou para o Brasil, mas determinado à morar um tempo em Nova York também. Um ano depois ele estava de volta na Big Apple e lá ficou também por décadas. Foi vizinho do Christopher Reeve (o Superman). Publicou inúmeras vezes no The New York Times. Fez cartão para o Museu de Arte Moderna e cardápios para restaurantes. Tocou muito tamborim e cuíca. Não faltam conquistas e histórias do Redi nesta imensa internet de nossas vidas cheias de googles e yahoos.

A última coisa que fizemos juntos foi a peça “Congestion Ahead” de Charles Casillo, que eu dirigí para um Festival no “The Village Gate” em 1992. Tudo era passado num metrô. O elenco era todo americano, menos o Redi que dizia apenas uma fala. A última da peça. A gargalhada final. Saudades de rir com ele.

E numa homenagem aos amigos leitores, aqui está um desenho inédito do Redi, feito, amassado e largado no meu apêzinho em Nova York, sobre as dificuldades de viver nos Estados Unidos sem um green card!




Todos os desenhos nesta página são ©Sylvio Redinger, do meu arquivo pessoal, e de reprodução proibida sem consentimento.

Wednesday, February 21, 2007

Meu rosbife na Big Apple!


Eu cheguei em Nova York na noite de 30 de abril de 1979. Estava vindo de Paris com a intenção de passar 21 dias antes que meu dinheiro acabasse de vez e eu voltasse duro para o Brasil pra catar qualquer emprego. Viagem marcada às pressas. Liguei da França pra uma amiga da minha mãe que morava em New Jersey pra me reservar um hotel barato e lá fui eu.

Peguei um táxi no aeroporto e percebí um problema. Eu falava inglês mas não o bastante pra entender o que tavam falando no rádio. E olha que eu já tinha me virado bem em Londres e Amsterdam só falando inglês. Resolví puxar um papo com o chofer. Eu sempre curto papo com chofer de táxi. Perguntei que tipo de bairro era onde ficava o hotel Wellington. Ele respondeu como se irritado pelo meu sotaque estrangeiro: “Neighborhood? There’s no neighborhood there”! Fim da minha iniciativa de papo.

Cheguei no hotel, check in, quarto decente. Deixa eu sair pra sacar a área. Descí de jeans e um casaco de couro que dava pra aguentar o friozinho de abril. Fui andando e de repente ví que estava na Broadway. Oba! Ví as luzes de Times Square e fui naquela direção como mariposa atraída por lâmpadas.
Na minha imaginação iria encontrar um monte de teatros e cafés bonitos tipo o Café de La Paix, no Boulevard Saint Germain em Paris. Só que frequentados por pessoas lindas como que saídas de filmes de Hollywood.

Nada disso! Mal comecei à andar na Rua 42 e saquei que era a maior barra pesada (hoje em dia não é mais). As pessoas pareciam zangadas comigo e eu nem tinha tido ainda sequer tempo de fazer mal à ninguém. Dei uma meia volta volver e saí andando com “cara de mau”. A gente faz coisas rídiculas quando está com medo.

Voltei para o hotel. Caí na real que tinha feito a maior besteira por não ter pego nenhuma dica com ninguém no Brasil antes de ir pra Nova York. Eu e minha mania de aventura! Mas aí tive a idéia! Eu conhecia UMA pessoa que estava morando em Nova York. Tom Jobim! Perfeito! Maravilha! Estou feito!

Antes de viajar para Paris em novembro de 1978, eu era diretor de RTVC da Esquire Propaganda e tinha produzido o filme de natal do Banco Nacional. O Tom fez arranjo para a tradicional música do banco. Arranjo do Tom, ele tocando piano e cantando com a Bebel Gilberto, produção musical de Ronaldo Bastos e Paulo Jobim, direção de fotografia de Fernando Amaral, direção de Domingos Oliveira, com a sua filhinha Maria Mariana aparecendo. Foi lindo!

Eu tinha tomado dois porres fantásticos com o Grande Maestro para convencê-lo. Ele nunca tinha feito nada para comercial. Mas fez amarradão e gostou. Ficou um clima bom, e quando o convidei para a festa de natal da agência ele foi na boa. Cade o catálogo telefônico? Hmmm... Jobim, Antonio Carlos Brasileiro de Almeida... nada! Jobim, Tom... menos ainda. Percebí que teria uns dias muito solitários em Nova York.

No dia seguinte, um belo sol de primavera e uma fome imensa. Onde comer? Saí andando e fui parar no Howard Johnson. Preços razáveis, cardápio meio fácil. Resolví pedir um sanduíche de rosbife. Até aí tudo bem até que a garçonete perguntou: “On what?”. Eu juro que não fazia idéia do que eu deveria responder. Ela notou e começou à falar em um monte de pães que eu não conhecia. Inclusive “bagel” , que me soou “beigli” que é um doce húngaro delicioso recheiado com nozes ou uma massa de sementes de papoula. É comprido e se corta em fatias. Não poderia ser um “doce de rosbife”.

Até que ela falou a palavra mágica: “Toast”. Yes!!! Toast! Seria o meu primeiro sanduíche de rosbife em torradas, mas era seguro! A Big Apple tinha me mordido, mas eu ia começar à dar as minhas dentadas. E acabei morando 15 anos em Nova York antes de me mudar para Bristol, Connecticut para comer muitos sanduíches de rosbife (sem torradas) na cafeteria da ESPN. Afinal, bagel é bom mesmo com cream cheese!

Lembro uma noite de insônia há quase 40 anos..

Achei um texto que escreví quando eu tinha 23 anos. Será que ter 23 anos em 2007 é muito diferente de ter 23 anos em 1967? Idade difícil ou os tempos mudaram?


Não consigo dormir, preocupado que estou com o reínicio da guerra no Oriente Médio. Lí, há pouco, no jornal que papai trouxe, que os russos mandaram navios para Suez “numa visita de boa vontade”, que é certamente a resposta aos americanos que estão novamente vendendo armas.

Acho que a 3ª Guerra Mundial está progredindo, já quase incontrolávelmente, e não faço a menor idéia de como se poderia impedí-la. Continuo crendo, no entanto, que se todos os jovens se unissem, poderíamos encontrar a solução. Mas para isto seria necessária a união de todos os jovens do mundo. E isso é tão difícil!!!

Passei hoje no “Damon”, casa de roupas masculinas a Rua Santa Clara, e o Abraão me disse que todos os dias pessoas leêm e copiam o meu poema que está num cartaz na vitrine. Fiquei muito feliz pois à quantas mais pessoas meu poema atingir, mas possibilidades há de uma tomada de consciência. Mas as pessoas estão cada dia mais dispersas!

E mesmo eu continuo dispersivo. As circunstâncias que me condicionam atrapalham imensamente os meus objetivos. Escreví hoje uma carta para a Nancy à quem estou inapelávelmente amando. Como eu gostaria de estar vivendo com ela agora...

O nascimento do meu sobrinho Márcio, anteontem, serviu para o meu instinto paternal chegar ao auge. Contudo, nestes tristes tempos que correm, é pouco racional fazer-se filhos. No entanto Márcio vive. E como ele, milhares de récem-nascidos pelos quais deve-se lutar para ter um futuro à oferecer.

Como a minha única forma de luta é a arte, gostaria de poder me dedicar completamente pois sei fazê-la útil. Mas, por estar absolutamente sem dinheiro e sentir plenamente a necessidade de viver sem a dependência dos meus pais que, coitados!, também estão em crise, vou precisar arranjar um emprego onde sei que não estarei fazendo o que de melhor ser fazer.

Acho que vou entrar para a BUA, para trabalhar na reserva, e as minhas experiências passadas bastaram para eu saber com certeza que a aviação não é o meu caminho, no entanto só um milagre faria à estas alturas que eu tivesse alternativa melhor. Juro que este milagre seria uma salvação!!!

Hoje dei um exemplar do “Recado”ao Mauricio Sherman. Vou telefonar depois para saber se ele o sentiu o bastante para oferecer divulgação num dos seus programas de televisão. Preciso também conversar com o Torquato Neto. O Torquato, me parece, terá algo à ver com a minha vida.

Vou levar um exemplar ao Vinicius de Moraes, ele certamente me incentivará ainda mais. Como eu gostei do seu olhar naquela noite no restaurante La Gondola, quando ele me disse: “Ah, poetão! Ele vai bem!” e me deu dois tapinhas paternais no rosto. Gostei da letra da canção que ele fez para o Festival Internacional da Canção.

Este festival está atravessado na minha garganta. Acho que o samba que eu fiz com o Taiguara poderia ter ganho o festival se estivesse concorrendo. Não que eu esteja super-estimando “Forma de Cantar”, mas é que tinha tanta canção “devagar”... Azar. Valeu a sensação de toda uma orquestra tocando nosso samba na televisão. Mas foi inegávelmente uma burrice a nossa falta de previsão.

Gostaria de saber se o Reginaldo Faria vai fazer um filme com o roteiro que escrevemos ou não. É mais uma coisa que depende de esperar e eu já estou cheio de esperar. E começo à me preocupar quanto à segurança dos objetivos do Reginaldo. Ele é bom, é inteligente, mas tão imaturo para a idade dele. Se ele fizer o filme bem feito será o caminho para a sua afirmação. Acho que ele é bom, e que é meu amigo.

Falando em amigo, o Hércio me parece tão perdido dentro de si. E o Henrique está à beira da insanidade com tanta maconha. Que exagero! Eu não posso fazer mais nada por ele, a nao ser desejar profundamente que ele se descubra. Me dá uma pena! Com uma voz tão bonita, com um som tão bonito na viola...

Som bonito faz o Caetano Veloso. Quero conhecê-lo melhor logo que tiver chance. Há muito não escrevia tanto quanto hoje. Estava sufocado dentro da minha solidão. Começo à ter sono felizmente! Paro por aqui. Quero sonhar coisas lindas esta noite. Quero um dia feliz amanhã, preciso que algo de bom aconteça. Preciso.


Eu sempre preciso.

Tuesday, February 20, 2007

Acabou nosso carnaval...

O Baile do Teatro Municipal era o grande evento do Carnaval Carioca. Os desfiles de fantasias sempre com destaque para o friburguense Clóvis Bornay, que consta ter sido o causador dos bailes de gala naquele teatro em 1937, seus arqui-rivais Evandro de Castro Lima e Mauro Rosas, e ainda mulheres como Zélia Hoffman e Wilza Carla (foto). Artistas de Hollywood, geralmente trazidos por Jorginho Guinle para o Baile do Copacabana Palace, também marcavam suas presenças no Municipal. Claro só entravam no baile os maiores de 18 anos. Traje à rigor ou fantasias de luxo eram a lei.

Em 1963, com 18 anos e meio finalmente foi a minha vez de ir ao baile que tantas vezes tinha visto na televisão. Fui com a turma do Mingão, meu grande amigo Domingos de Oliveira. Domingos era quase um guru para nós. Lembro dele fantasiado de pierrô.

A sensação que mais lembro foi que parecia que o salão fazia os movimentos ao rítmo da música, e que nós os foliões apenas acompanhávamos. Talvez tenha sido o scotch que pude comprar oficialmente pela primeira vez, talvez um lenço perfumado que me deram.

Foi um carnaval maravilhoso e que continuou na terça-feira com festa no terraço do Domingos na Rua Anita Garibaldi. Era o melhor lugar do Rio. Onde já tinhamos ensaiado teatro, curtido festas maravilhosas e conversado sobre tudo. Onde depois conhecí Leila Diniz fazendo ponto para o meu amigo baterista Nelsinho na peça “Somos Todos do Jardim da Infância”. Leila que seria depois mulher do Domingos, minha amiga-irmã e musa de uma geração de brasileiros. Um lugar que merece capítulo(s) à parte, mas quem assistiu ao filme “Todas as Mulheres do Mundo” já o viu.

Mas eu lembro que quando estava acabando esta festa de terça-feira, resolvemos Carlos Lyra, Odete Lara, Antonio Bivar e eu pegar um táxi para a Cinelândia para ver o que ainda estava rolando na Avenida Rio Branco. Não foi fácil achar um táxi, mas nos esprememos num fusca e fomos para lá.

As imagens das pessoas no finalzinho do que seria penúltimo carnaval antes do golpe militar eram da maior poesia. Fim de carnaval, amores que terminam, amores que apenas começaram. Umas pessoas bebadas cantando desafinadamente em paz, confeti, serpentinas, lantejoulas brilhando independentes nas ruas do centro da cidade. Garrafas e latas douradas vazias e abandonadas pelo chão. O ruído dos primeiros caminhões de limpeza urbana começando à chegar eram o contraponto para os últimos pandeiros que sacolejavam hesitantes em mãos já cansadas.

E como se podia esperar, pouco depois nasceu o dia. Um belo sol de quarta-feira de cinzas que nos convidava à voltar para a Zona Sul, talvez dormir um pouco, e ir para a praia. O ano iria começar. Acabou o nosso carnaval.


Meses depois, o mesmo Carlinhos Lyra junto com o grande Vinicius de Moraes criou e lançou esta música que está no coração de todos os brasileiros:

Acabou nosso carnaval
Ninguém ouve cantar canções
Ninguém passa mais brincando feliz
E nos corações
Saudades e cinzas foi o que restou

Pelas ruas o que se vê
É uma gente que nem se vê
Que nem se sorri
Se beija e se abraça
E sai caminhando
Dançando e cantando cantigas de amor

E no entanto é preciso cantar
Mais que nunca é preciso cantar
É preciso cantar e alegrar a cidade

A tristeza que a gente tem
Qualquer dia vai se acabar
Todos vão sorrir
Voltou a esperança
É o povo que dança
Contente da vida feliz a cantar

Porque são tantas coisas azuis
E há tão grandes promessas de luz
Tanto amor para amar
De que a gente nem sabe

Quem me dera viver pra ver
E brincar outros carnavais
Com a beleza dos velhos carnavais
Que marchas tão lindas
E o povo cantando
Seu canto de paz



Para mim, a “Marcha da Quarta-Feira de Cinzas” será sempre quase como o meu hino particular evocativo daquele carnaval.

Naquele ano, a Mangueira ficou em 2º lugar com o tema Exaltação a Bahia, e o Salgueiro ficou em primeiro com o fantástico Chica da Silva .

Monday, February 19, 2007

Me casei na terça-feira gorda!

Só que eu era bem magrinho em 1973. Eu estava namorando a Cláudia há um mês. Grudação total, maravilha, grande amor. Aí rolou o carnaval e o convite pra passar ele na casa do Carlos Imperial em Marataízes, no Espírito Santo. O Gordo não estaria lá, mas os seus filhos Maria Luiza, Marco, e amigos. A gente resolveu ir de repente. Saímos no sábado no meu Peugeot 303 preto 1960, que mesmo mais novo parecia um carro de filme do Al Capone.

Avenida Brasil congestionada e tal, quando chegamos lá por Araruama eu já estava estourado de dirigir e estava na cara que não dava pra chegar em Marataízes naquela noite. Como eu tinha ótimas lembranças de infância em Araruama, foi naquela lagoa que eu aprendi à nadar com a minha prima Georgina quando eu tinha uns 8 anos, achei uma ótima idéia passar a noite lá e depois prosseguir a viagem no dia seguinte.


Tudo bem. Mas e hotel? Estavam todos completamente lotados. Aí eu dei de cara com o Camping Clube do Brasil. Ótimo. Um dos diretores da organização era o irmão mais velho do meu amigo Paulinho Abranches. Pensei que seria QI o bastante para arrumar uma cabine. Fomos lá. Estava tudo reservado e não adiantava nada ser amigo de ninguém. “Mas não dá pra dar um jeitinho?”

O jeitinho era comprar um título do Camping e poderiámos passar uma noite lá e no futuro usufruir dos benefícios do tal título. Fomos ver a cabine. Dava pra quebrar o galho. Enquanto a Cláudia tomava um banho e fui lá pra o escritório preencher o tal título. Ele permitia que você incluísse como dependentes mãe, irmã ou esposa. Minha mãe não era do tipo camping, irmã não tenho – tenho dois irmãos. O vendedor disse para eu botar o nome da minha esposa. “Bem, ela não é de fato a minha esposa, é a minha namorada”.
O vendedor disse que não fazia mal e que podia por o nome dela assim mesmo.

Voltei pra cabine morrendo de rir e dizendo que ela tinha virado a minha “esposa”. Depois, entre beijos e carinhos, eu disse que se “aqui fosse como nos Estados Unidos, eu casava com ela mesmo”. Ela tinha ouvido falar que havia um lance com dispensa de proclamas e resolvemos ríndo que iríamos nos casar em Marataízes.

No dia seguinte, curtimos a lagoa salgada (só encontrei água mais salgada quando fui ao Mar Morto, em Israel, em 1996) e prosseguimos viagem. Chegamos em Maratáizes, anunciando que íriamos nos casar lá, e fomos recebidos com festa e carinho pela garotada que nem tava fazendo muita fé que a gente iria mesmo. E também com o único quarto com cama de casal. A gente se divertia durante o dia, e de noite a galera ia pra baile e a gente ficava em casa, em lua de mel.

Na segunda, todo mundo se entulhou no meu carro e fomos para um passeio. Na volta eu quis dar uma parada em Cachoeiro de Itapemirim, mas fui voto vencido. Confesso que agí infantilmente e resolví voltar para Marataízes como se o meu velho Peugeot estivesse em treino para Formula 1. Claro, foi a primeira vez que minha namorada e eu brigamos. A galera foi para o baile e nós ficamos em casa brigados. Pelo imenso período de duas horas. O amor era maior.

Terça de carnaval de tarde. Claudia e eu esparramados na rede e o Marco Imperial tocando violão. E eu digo: “E o nosso casamento?” E ela diz: “Vamos”. E eu digo: “Eu estou falando sério”. E ela diz: “Eu também. Com uma condição. E eu pergunto: “Qual?” E ela diz: “Se não der certo a gente se separa como amigos”. E eu: “Perfeito!”. E me viro para o Marco e digo pra ele pra parar com o violão porque ele tem que nos mostrar onde é o cartório. Ele disse: “Se eu me levantar daqui vocês vão ter que casar mesmo, hein!”

Como ele era “de menor” fomos catar a Marluce no bar e fomos para o cartório, que claro, era na residência da tabeliã. Batemos palmas e lá veio Dona Georgette espantada porque neste momento eu estava vestindo uma mini-blusa da Claudia e ela uma das minhas camisas. Mas eu expliquei que a gente tinha gostado tanto de Marataízes que queríamos nos casar lá. Ela disse que só com autorização do Juiz, e nos deu o endereço dele. Lá fomos nós.

Por coincidência, a casa do Juiz era ao lado da casa do Imperial. Ele nos olhou achando que estavamos de gozação, mas mandou voltar ao cartório e preparar a papelada para ele apreciar a justificativa. Voltamos ao cartório e dissemos para a Dona Georgette preparar tudo... que o juiz assinava! Ela foi catar o escrivão que estava num bloco e teve que ir tomar um banho antes para baixar o teor alcoólico. Preparou a papelada e voltamos para a casa do juiz com a Dona Georgette e os papéis à tiracolo.

Só que o juiz tinha ido levar os filhos para o baile infantil do Iate Clube. Fomos para lá. Só deixaram a Dona Georgette entrar. Depois ela voltou e nos buscou. O juiz passou um meio-pito porque não explicamos nada. Mas os seus amigos estavam dando força, e ele escreceu um parecer dizendo algo tipo “compreendendo os anseios da juventude e também pressupondo razões que óbviamente não precisam ser declaradas aqui”. E pronto, fomos para casa tomar banho para voltar para o cartório às 21hs para casar. Foi neste momento que o Marco Imperial me chamou para um canto e disse que eu não precisava me casar só porque tinha interrompido o seu violão.

A Cláudia improvisou uma linda saída de praia de rendas ao contrário como vestido de casamento, e eu vestí a minha camisa dourado com enfeites de purpurina. Casamos. E fomos como convidados de honra para o Baile do Iate, onde todos vinham espiar “os que casaram”.

Pouco mais de um mês depois casamos na Igreja com figurinos de Cláudio Tovar, músicas de Bach, Taiguara e eu, e Egberto Gismonti arranjadas para clarinete e orgão pelo meu amigo, o Maestro Eduardo Souto Neto. O casamento durou 3 anos. Alguma coisa mágica dura há muitos carnavais.


Em 1973 a campeã do carnaval foi a GRES Estação Primeira de Mangueira, com Lendas do Abaeté.

Sunday, February 18, 2007

Fui Rei sem ser Momo

Comecei este blog contando a minha chegada em Budapeste e minhas complicações alfandegárias. Bem, a situação foi ficando tão irritante que meu amigo Peter resolveu mandar email para duas televisões contando a minha novela burocrática. Claro, burocracia húngara é tão batida para o jornalismo local que nem é assunto. Mas passados vários dias o repórter Laszlo Ligeti do programa Aktiv da TV2 respondeu o mail do Peter e disse que estaria interessado em fazer uma matéria sobre mim pelo aspecto “filho pródigo” e carreira. Entramos em contato e eu topei (por que não?).

Matéria marcada para gravar numa quarta-feira e tal, mas antes ele me liga de véspera dizendo que teria um “American Football Gala” no Festival Sziget que estava rolando no verão, e que gostaria que eu fosse com ele para gravar algumas imagens para a matéria. Tudo bem. Eu fiquei matutando o que seria isto? Gala? Tapete Vermelho? Preciso de um smoking rapidinho? Pelo sim pelo não mandei um email comunicando a tal da gala para o Diretor de Relações Internacionais da NFL, que respondeu imediatamente com um mail de simpatia pelo futebol americano na Hungria.

Quando o repórter veio me buscar pedí para ele me ajudar a escolher que roupa eu deveria usar. Fiquei surpreso quando ele escolheu uma camisa de Super Bowl e jeans. Mas enfim, a gala não era minha e eu não estava preocupado em cantar de galo. Fomos pra Sziget (uma ilha no rio Danúbio).

Chegando lá eu achei que tinha voltado no tempo. Woodstock em Budapest? Mó galera com cara de hippie anos 70. Comidinhas, muita bebida, rock and roll. E eu ainda sem entender a tal da gala e menos ainda futebol americano no meio daquela turma pouco atlética. Até que chegamos numa área onde estava rolando um jogo de exibição de futebol americano com combinados dos times da Hungria. Foi quando saquei que a palavra “gala” aqui pode ser usada coloquialmente para significar apenas “evento”! De qualquer maneira dei a cópia do email da NFL para o presidente da MAFZ (a liga húngara) Laszlo Toth que eu conhecí naquele... evento.

Bem, 6 meses, 2 matérias nas estações de maior audiência daqui (TV2 e RTL Klub), 11 jogos de College Football comentados em húngaro no canal Sport Klub, entrega de medalhas no Blue Bowl I, na Arena Bowl I, coluna semanal no site da liga durante a temporada da NFL, neste sábado de carnaval fui convidado para o 1º “Amerikaifutball Bál”. “Bál” em húngaro é “baile”. Eu estava certo que apesar de ser sábado de carnaval não ia rolar nem samba, nem mulher boa de bikini e nem Rei Momo. Também não esperava valsas. Mas o convite pedia paletó e gravata ao menos. Como se vê nesta foto com meus dois amigos "Lászlos", o Ligeti à esquerda e o Tóth à direita.

A festa foi muito maneira, com a presença de técnicos e jogadores dos vários times húngaros, árbitros, fans da bola oval, e o anfitrião foi o Attila Arpa, pioneiro do FA na Hungria, diretor de estação de tv, linebacker do Budapest Wolves, produtor de cinema... merecedor de um capítulo à parte. Teve um comediante famoso que não me fez rir ou porque meu húngaro não dá pra isto ainda ou porque ele não era de fato muito engraçado. Ou por ambos. Mas a galera estava mais ligada em papear, participar de um quiz, karaoke, aparecer na reportagem que vai passar na tv na segunda ou na terça, ser sorteada em rifa de vários premios.

Duas coisas foram muito especiais para mim. O fato de receber muitos cumprimentos do povo que assistiu meus jogos no Sport Klub (com o inevitável comentário pelos meus altos e longos "toooouchdowns". Os locutores esportivos daqui, mesmo os melhores, não costumam ser muito animados. Não tão tépidos como os britânicos, mas menos apaixonados...). E a outra coisa é que o baile teve um Rei e uma Rainha. A Rainha foi uma gatinha loura e o Rei... fui eu! Por esta eu não esperava! O mico da coroa de papel foi compensado pelo premio para os monarcas da festa. Táxi de graça para casa.

Considerando que moro tipo a uns 18kms do local da festa... valeu!

Friday, February 16, 2007

Era Hollywood em Copacabana...

Eu era um adolescente noctívago. Comecei a trabalhar em teatro aos 13 anos e não era muito fácil adormecer depois da adrenalina de um espetáculo. E me amarrava em ficar de papo depois. Aos 14, quando trabalhei na peça “O Chapéu de Palha da Itália”, no Teatro da Praça (já há anos Gláucio Gil) fui levado pela primeira vez no restaurante “La Gondola”, na Rua Sá Ferreira. Quem me levou foi a Célia Biar. A galera mais da antiga lembra bem dela com o gato (literal) Zé Roberto, apresentando os filmes da madruga no ínicio da TV Globo.

A Gondola e a Fiorentina eram os restaurantes da classe teatral. Era uma “classe”. Uma sociedade à parte. Não apenas artistas e diretores de teatro e televisão se encontravam para jantar e bater papo, mas muitos elencos de peças eram formados neste restaurantes. A escalação do Vesperal Trol (conhecido também como “Teatrinho Trol” na história da televisão brasileira) era sabida antes na Gondola, na mesa do Fábio Sabag, (sempre com o Roberto de Cleto, Zilka Salaberry, Oscar Felipe, Germano Filho e turma), do que na tabela da TV Tupi.

Eu não era o único garoto que frequentava o lugar, mas eramos poucos. Lembro que André Valli, Mário Valle (que foi depois um costureiro famoso), Luiz Armando Queiroz, já estavam tietando por lá antes de começarem as suas belas carreiras. Era também um lugar onde apareciam pessoas-personagens como o travestí Sofia Loren, o primeiro à conseguir notoriedade no Brasil, e de vez em quando Vinicius de Moraes.

Todo mundo se conhecia. Se você não visitasse e passasse algum tempo em 4 mesas no mínimo, você não era um frequentador digno de ter uma conta. E era uma onda pendurar e ter uma conta mesmo se você tivesse a grana no bolso pra pagar. O garçon Chico sabia das finanças e eu sempre suspeitei (sem jamais ter comprovado) que ele dava umas dicas pra rolar um cachêzinho na TV Tupi pra quem estava com mais contas no prego.

Muitas festas começaram e muitas terminaram no pequeno restaurante. E eu passei muitas horas de papo lá, geralmente com os mais velhos. Escapando de algumas incömodas paqueras, mas curtindo todas as fofocas e as conversas sobre cinema, teatro, paixão e vida. E sobre não perder tempo com preconceitos e prestar atenção nas pessoas. Muitas histórias ficaram e muitas foram esquecidas. O talentoso cenógrafo e figurinista Napoleão Moniz Freire gostava de contar uma aventura sua num trem com o Montgomery Clift. O fascinante pra mim não era a aventura em sí, mas ser amigo de alguém que esteve com alguém que trabalhou com a Elizabeth Taylor nos Estados Unidos. Que era muito mais distante quando os vôos eram no “Constellation”, antes dos jatos aparecerem no mapa.

Uma vez apareceu a Viveca Lindfords na Gondola. Uma atriz sueca que não era Greta Garbo, mas tornou-se estrela de Hollywood desde que estreiou num filme com Ronald Reagan. Ótima atriz no entanto.

Na peça de Fernando Mello “Greta Garbo, quem diria, terminou no Irajá”, na excursão do Actor’s Studio ao Brasil, Viveca Lindfords quem diria... terminou na Gondola. Eu estava enturmado com o pessoal que levou ela para lá, e ganhei atenção especial na mesa porque levei o maior papo com o marido dela, o diretor George Tabori, que era húngaro. Mas não foi meu passaporte para Hollywood.


Só fui ver o famoso letreiro em 1993, quando fui pela primeira vez a Los Angeles para comentar o Super Bowl XXVII em Pasadena, na Califórnia. Estrelando Ivan Zimmermann.

Em feverê tem carná!

"Ela é fan da Emilinha. Não saí do César de Alencar. Grita o nome do Cauby e depois vai desmaiar!" Mas quem curtindo carnaval não era fan da Emilinha Borba? Até hoje as músicas que ela tornou populares animam qualquer baile de carnaval que seja mesmo animado. "Chiquita Bacana", “Tomara que chova”, “Vai com jeito”, “Mulata Iê-iê-iê” e tantas outras que ficaram gravadas no verdadeiro espírito do carnaval brasileiro.

Eu conhecí a "Rainha do Rádio" pessoalmente como "Tia Emilinha" pois namorei e fui completamente apaixonado por uma de suas sobrinhas quando eu tinha 16 anos. Eu quis fazer um filme sobre a cantora lá pelos finais dos anos 70. Ela topou. Mas não rolou produção. Pena. E a ex-namorada nunca mais encontrei, mas encontrei a Emilinha há poucos anos na Fiorentina quando tiramos esta foto. Ela mantinha o mesmo humor. Figura!

Tenho boas lembranças de carnaval. Desde garotinho. Desde que o equipamento de qualquer criança no Rio de Janeiro era composto de confeti, serpentina e lança-perfume. Lança-perfume era pra dar aquele friozinho nos outros. Levei muitos anos pra entender porque alguns adultos queriam um friozinho nos lenços.

E carnaval de rua era de rua mesmo. A turma cercava a esquina da Santa Clara com Domingos Ferreira, bem em frente à Loja Balnéa. Juntava os músicos e era o programa da tarde. Pra mim, além das memórias, sobrou esta foto tirada naquela esquina. E também a memória dos blocos que desciam a rua e que me faziam até tomar esporro quando eu era pequeno. Eu saía correndo da mesa de jantar para ver o bloco passar. De araque eu iria deixar passar um sem dar uma sambadinha junto. E quando ouço um frevo me arrepio ainda como se eu tivesse me criado em Olinda.

E neste momento estou em Budapeste ouvindo Chico Buarque cantando “Ñão existe pecado do lado de baixo do Equador”. Não é tão carnavalesco mas eu gosto e tem tudo à ver. Mas dando uma espiada nos preparativos para o Carnaval 2007.

“A prefeitura de Olinda vai colocar 1.200 policiais militares e 100 guardas municipais pelas ruas da cidade durante os quatro dias de carnaval para tentar coibir a prática do beijo forçado e “atos libidinosos” entre os foliões.”

Hmmm... Acho que o senhor prefeito não conhece esta música do Chico.

“O carnaval tem de ser um evento mais generoso com a população. A idéia do Pipocão é democratizar a folia. Chega de abadás e cordas”, disse Carlinhos Brown em Salvador.

É, atrás do trio elétrico só não vai quem já morreu. Eu já fui. Passei um ótimo carnaval na Bahia acampado no Camping. Mas eu estava casado. Acho que preciso experimentar um estando solteiro...

“Essas bigas são maravilhosas e relatam exatamente o início do nosso enredo: Roma, a origem da língua portuguesa, o latim. Com elas, vêm os gladiadores, os guardiões. Será um espetáculo junto a um Coliseu monumental. O carro vai causar impacto pelo seu tamanho, pelo seu gigantismo e pelos efeitos especiais”, garante Max Lopes.

Go, Mangueira!!!

Eu não tenho a chance de curtir um carnaval no Brasil desde 1979. Também naquele ano agitei o que tinha direito. Banda de Ipanema (com fantasia criada pelo Luis Salém) e tudo mais. Saí até na avenida no Bloco Alegria de Copacabana, com a Ligia Diniz, a Miriam Pérsia e uma turma muito legal.

Agora a fantasia que me resta é sair numa escola que use esportes como tema. Quero estar num carro alegórico em cima de uma bola oval, fantasiado de juiz de futebol americano. Sambando de braços levantados em sinal de TD e rodeado de lindas moças vestidas (despidas?) de cheerleaders, quem sabe cantando um refrão: “e é toooooouchdoown”!

Thursday, February 15, 2007

Eu não posso não falar de futebol americano!


O plano aqui deste blog não é ser um blog de esportes, mas que eles vão entrar no registro quando me der vontade... ah, isso vão! Eu estava espiando uns arquivos antigos no meu drive de backup e dei de cara com esta entrevista que eu dei em dezembro de 1998. Não consigo lembrar para quem e nem para onde. Ou mesmo se foi publicada. É uma pena esta minha falha de memória porque as perguntas foram muito legais. Se alguém souber, me avisa! Interessante reler isto mais de 8 anos depois e compartilhar aqui, à luz da realidade de hoje. Este era meu papo em 1998!


Como você vê o crescimento do futebol americano no país do futebol ? Que horizonte você enxerga para a massificação do esporte frente à paixão do torcedor brasileiro por seu clube de futebol?


O Brasil sempre se mostrou rápido para absorver qualquer novo entretenimento. Sob este aspecto o futebol americano vai crescer na medida do aumento de lares com tv por assinatura. A reação positiva começa quando o telespectador percebe que é um esporte não só de força (“um bando de caras dando encontrões uns nos outros e começando tudo de novo”), mas de inteligência e estratégia. É a maneira pacífica de se observar ações quase paramilitares e isto tem tudo a ver com a natureza humana. É uma guerra territorial, e um jogo de xadrez entre técnicos.

Já quanto a massificação do esporte… se ocorrer, ela será mais demorada e ainda deve levar uma ou duas gerações pelo menos. Qualquer massificação ocorre por identificação. E não só no esporte, é claro. A novela brasileira é um exemplo perfeito. Ela trata (mesmo de forma fantasiosa) do cotidiano do rico e do pobre, e seus personagens fazem de tudo para conseguir os seus “touchdowns” particulares na “endzone” da sorte. Os preferidos do público…conseguem!

O talento do brasileiro para o futebol se verificou na prática dele. Afinal é um esporte importado da Inglaterra (dele deriva o rugby, que se modificou no futebol americano – o Australian Rules Football e o Hurling Irlandês também vem do futebol que o brasileiro domina). Para um menino brasileiro “ser bom de bola” é um ponto quase de honra. O futebol americano, devido a variedade de posições, oferece alternativas para o menino mais pesado, para o que apesar de não ter habilidade de drible com as pernas, é no entanto veloz na corrida, etc. É um esporte que tem lugar para jogadores de biotipos dos mais diversos, e que pode ser uma boa opção.

Portanto só quando você estiver vendo a garotada jogando futebol americano nas escolas, condomínios, terrenos baldios, ou na praia que você pode antever uma possível massificação. Mas é fácil. Tudo começa com uma bola e um campo.


Quais as semelhanças e diferenças que você enxerga entre o modo de torcer do brasileiro e o carinho que os fãs dos EUA tem para com seu time favorito ? Você acredita que existem diferenças culturais na forma de torcer ou o amor pelo esporte transcende isso?

Torcedor é torcedor. O seu time favorito representa o seu orgulho e por isto você quer a vitória dele. Eu não lembro quantos times profissionais de futebol existem no Brasil, mas nos Estados Unidos são apenas 30. E o país tem 50 estados. A Califórnia, Nova York, Flórida e a Pensilvânia são os mais representados entre eles. Mas a escolha do time não segue exclusivamente o regionalismo. É claro que o povo de Winsconsin tende a torcer pelo Green Bay Packers, mas um cidadão de Idaho pode ser torcedor do Dallas Cowboys ou do San Francisco 49ers por suas próprias razões subjetivas. Além disto, os times são propriedades privadas que muitas vezes mudam de estado. O Palmeiras nunca será um time de Minas Gerais. O Flamengo jamais se mudará para Belém do Pará!

Futebol americano é complicado? Como é destrinchar isso para o telespectador?

O futebol americano é complicado pelas filigranas das regras, mas é um jogo relativamente simples. O objetivo do ataque é ganhar território e chegar na endzone para marcar pontos. Com corridas ou passes aéreos. O objetivo da defesa é impedir isto. Uma vez isto entendido, fica fácil para o telespectador acompanhar. Eu procuro descomplicar os detalhes.

Como foram suas primeiras transmissões? Você se lembra de ter cometido alguma gafe na fase de familiarização com as regras?

As minhas primeiras transmissões foram bastante circunstanciais. E por sorte, a nossa audiência ainda era pequena. Cometi muitas gafes sim. A única coisa que acho que nunca fiz foi inventar… o que não existia (a não ser talvez por alguns touchdowns precipitados).

Quando vocês realizam as transmissões vocês conseguem aproveitar as informações que são dadas pela narração original das emissoras ABC e ESPN ? Onde vocês procuram as notícias ou informações que complementam a longa transmissão de no mínimo 3 horas?

A narração original para mim serve mais como um guia, se bem que as vezes pode me complementar uma informação de campo. A minha atenção é no jogo, pois qualquer desconcentração pode resultar em erro. Se é para errar, prefiro cometer meus próprios erros.

A produção da ESPN nos provê com pacotes de informações imensos, que contém os releases e os “game notes” que são fornecidos à mídia pelos times. Além disto, recortes de jornais e impressos de histórias publicadas na internet. É claro que nós acompanhamos o dia a dia do esporte, assitindo trechos de várias partidas diurnas, resenhas, mesas redondas na televisão. Outra coisa muito importante é que a gente vive nos Estados Unidos há muito tempo e isto nos ajuda à enriquecer as partidas dentro de um contexto bem amplo e dentro do cotidiano. Pessoalmente, uso muito a internet. Recebo diáriamente um email com as ultimas notícias, detalhes de todas as partidas da rodada, e para estar por dentro do que é importante para o brasileiro eu acompanho os destaques na Redzone, assino a lista da Redzone e visito o #NFL-Brasil da Undernet.


Na sua opinião, os inúmeros intervalos comerciais que ocorrem durante uma partida não podem tirar o dinamismo para o telespectador e prejudicar uma audiência mais fiel?

Os intervalos ocorrem geralmente após um touchdown ou field goal, após o kickoff seguinte, e quando o jogo pára por pedido de tempo. O telespectador não está perdendo absolutamente nada da ação. Uma transmissão de NFL é caríssima. Sem comerciais… ela não existiria.

O que você mais admira na NFL? Você tem alguma crítica ao processo de organização como um todo?

Eu acho uma liga muito bem organizada. Acho que é uma liga atenta para o seu público e bastante dinâmica. Um bom exemplo é a rapidez como após com o incidente da moeda no jogo do Steelers com o Lions, a NFL mudou o procedimento para que o capitão designado do time visitante escolhesse “cara ou coroa” antes da moeda ser lançada ao ar, e não durante o tempo em que a moeda está no ar como era tradicional. Acho que Paul Tagliabue faz um excelente trabalho e imagino que não deve ser fácil mediar todos aqueles poderosos milionários que são os donos dos times.

Detalhe: O fato que em 1999 já teremos um novo Cleveland Browns, mostra também uma sensibilidade para com a torcida que não ocorreu quando o Baltimore Colts “fugiu” para Indianapolis.


O que você acha que fará a diferença nos playoffs da temporada deste ano, que estão se aproximando? Você tem um palpite sobre quem estará no Super Bowl em Miami?

Um fator importante será a sáude. Jogadores importantes contundidos podem fazer a diferença. Por exemplo, a perda de Bryant Young para a defesa já inconsistente do 49ers poderá ser um problema sério nos playoffs.

Por desempenho até a semana 13, o mais óbvio seria encontrar Denver e Minnesota no Superbowl. Mas playoffs tem a sua própria vida, e surpresas acontecem. A maior surpresa para mim este ano na AFC tem sido o New York Jets, que está mandando muito. Na NFC, tanto o Packers, quanto o 49ers, quanto o Cowboys são tradicionalmente fortes nos playoffs e podem criar problemas para o Vikings. Mas este ano tem o Atlanta pressionando e impressionando. A zebra em Miami pode ser Falcons e Jets.


Qual o touchdown mais emocionante que você já narrou?

Esta é a pergunta mais difícil, pois foram tantos. Desde históricos como o do recorde de Jerry Rice e passes de Joe Montana e Dan Marino, e corridas de Emmmit Smith e Barry Sanders até proezas de Deion Sanders. Mas houve um retorno de kickoff de noventa e tantas jardas de Tamarick Vanover na sua temporada de estréia na NFL que me pegou de surpresa e que foi muito emocionante.

Que recado você deixa para os fãs brasileiros que ficam até altas horas da madrugada acompanhando as transmissões da ESPN?

Vocês são a minha motivação para eu fazer o que eu faço.


PS: Em 1999 o Denver Broncos derrotou o Atlanta Falcons por 34 a 19 no Super Bowl XXXIII. Eu não estava tão fora...

Havia um forno famoso...


Os doces da Confeitaria Piccadilly, dos meus pais, eram os mais gostosos do Rio de Janeiro entre 1949 e 1963. Da torta rigó jancsi de chocolate, com recheio de creme chantilly misturado com cacau, aos milfolhas, sempre fresquinhos. Eram também dos mais caros da cidade. A não ser para os porteiros e empregadas da Rua Hilário de Gouveia 88 (e seus vizinhos) em Copacabana. Antes de fechar a loja, tanto os mil-folhas, quanto outros doces na base de creme de baunilha ou chantilly eram generosamente distribuídos. Não era admissível vender sobras no dia seguinte.

Por isto meu pai acordava às 3-4 horas da manhã para ligar o fôrno.
As vezes, eu dava mais algum tempo de sono pra o velho. Principalmente nas segundas-feiras nos ínicios dos anos 60. Era a noite do Grande Teatro Tupi, alternadamente dirigido pelo Sergio Britto e pelo Fernando Torres. Quando tinha papel para garoto eu tava dentro. Aliás se tivesse para mais de um, porque a preferência era para o Claudio Cavalcanti que tinha trabalhado com eles no TBC (Teatro Brasileiro de Comédias), e a maior parte do elenco era de lá.

O Claudio era o meu melhor amigo. Mais velho do que eu 3-4 anos, era o único na Tupi perto da minha idade. A gente curtia Elvis Presley e praticávamos inglês tirando letras das músicas dele. E do Paul Anka, que assistimos no Copacabana Palace e no Maracanãzinho. Foi muito irado conhecer o Paul Anka nos bastidores e curtir papinho em inglês com ele.

Numa das minhas idas ao Rio, em 2003, o Claudio já era vereador e me acompanhou numa audiência com o Secretário de Esportes da Prefeitura, Ruy Cezar, quando fui pedir um apoio pra galera que joga futebol americano nas praias do Rio. A turma do Carioca Bowl. Quem sabe se um dia este apoio saí?


Divago. Mas depois do Grande Teatro eu saía com a turma para jantar geralmente na Cantina Veneziana, na Rua Siqueira Campos. As vezes na Fiorentina.

Era muito divertido e para mim foi uma grande escola de cultura. Os grandes autores e escritores do mundo todo eram discutidos. E no dia seguinte eu comprava livros. Não queria ficar fora dos papos e não havia um google para fazer um “search” rapidinho para saber quem foi Fyodor Mikhailovich Dostoievsky. Tinha que ler O Idiota, Crime e Castigo, Os Irmãos Karamazov.

Mas meus “professores” não ficavam só nos papos eruditos. Depois do jantar sempre rolava uma rodada de “escravos de jó” com caixas de fósforos com a participação de Sergio Britto, Fernanda Montenegro, Ítalo Rossi, Zilka Salaberry, Francisco Cuoco, Carminha Brandão, Paulo Padilha, Natália Timberg, Aldo de Maio, e tantos outros grandes atores que eram desta falange.

E depois alguns iam comigo ligar o forno da Confeitaria Piccadilly na madrugada e comer uns doces gostosos oferecidos pelo filho do dono na base do 0800.

Wednesday, February 14, 2007

Grandes artistas nos marcam a vida inteira

“Meu desafio como autor foi sempre o de retratar este povo, procurando identificar a consciência do que ele representa como povo. Eu sempre procurei falar sobre o povo, mas não com um realismo terrível. Eu quero é ressaltar o lado extremamente positivo e de superação das dificuldades, esta inclinação que o popular possui. Minha opção política foi sempre um retrato da necessidade que eu tinha de fazer alguma coisa, de contribuir com algo construtivo, e nunca arredei pé disso. Eu continuo até hoje fiel àquilo que eu senti quando comecei a fazer teatro. Isso me dá uma responsabilidade grande, imensa, de ser fiel a esta causa. Logo após a estréia de "Eles não usam Black-Tie" no Teatro de Arena, que foi um enorme sucesso, eu fui chamado para uma homenagem. Naquele momento, eu fiz um juramento para mim mesmo, um pouco bombástico, mas fiz: a de que eu jamais, jamais trairia a causa de usar a minha arte para defender o povo.”

Relí estas palavras de Gianfrancesco Guarnieri na comunidade de Orkut que o Bernardo Procópio fez pra ele. E já tinha deixado lá o meu recado: “Obrigado por ter existido. Pelas peças que ví, pelos papos que batemos nos anos 60, pelo "Grande Momento". Por meu grande momento fazendo o “Chiquinho” na remontagem do Arena no Rio em 63, com o Paulo José. Pelas motivações de juventude. Obrigado até por não termos nos revisto há décadas. A lembrança será sempre jovem e dinâmica. Morre Guarnica, sua obra fica pras gerações.”

Eu tinha uns 15 anos e já tinha visto muito teatro. Era fominha. Ví os grandes atores e atrizes do Rio. E já tinha sido “filho” de muitos na televisão e no teatro. Mas sempre vou lembrar quando uma galera de Sampa fez uma sessão pra classe teatral do “Eles não usam Black Tie” do Guarnieri. A peça já estava sendo uma revolução cultural em São Paulo, e todo mundo tava doido pra assisitir no Rio.

E eu que era um garoto querendo entender as coisas sempre vou lembrar daquela noite num Shopping Center da Siqueira Campos que ainda nem estava todo pronto. Oduvaldo Vianna Filho, Miriam Mehler, o grande Milton Gonçalves, Lélia Abramo, Xandó Batista, Chico de Assis, Celeste Lima, Henrique César, Riva Nimitz e claro, Flávio Migliaccio como “Chiquinho”, balançaram geral. Era um teatro novo que falava de gente com linguagem de gente de verdade. José Renato não parecia ter dirigido a peça e sim ter colaborado com apenas um sopro de vida para que aqueles personagens simples e humildes convivessem.
Eu conhecia gente parecida. Eram os operários de construção. Só não tinham sotaque paulistano. Lembro que meu querido amigo Milton Gonçalves tinha um sotaque na época que era o próprio “default” do paulistês.

E que maravilhas que foram “Gimba, Presidente dos Valentes” e “Arena conta Zumbi”. Eu fui pra São Paulo e vi o “Zumbi” tantas vezes que sabia o texto todo. Tava prontinho no banco de reservas, mas não rolou entrar em campo. Aliás, no palco.

Hmmm... Teatro dá saudades.

Copacabana me engana (ou "Políticamente Incorreto")


(esta era para o livro)

Eu me criei na Rua Santa Clara 41 apto. 101 em Copacabana. Cheguei lá com 3 anos e meio, e era o único prédio da quadra. Hoje é o mais baixo com seus 9 andares, e o apartamento térreo já virou loja há muitas décadas. Copacabana era um planeta completamente diferente de Budapest, onde estou morando há 7 meses com a gaivota-mobile comprada na Praia da Pipa, no Rio Grande do Norte!

Segundo mal me ensinaram em criança, todos os nordestinos eram da Paraíba. A pracinha onde eu andava de charrete puxada por um bodinho (será que foi por isto que deixei o cavanhaque quando ele ficou branco?), a Serzedêlo Correa, era a “Praça dos Paraíbas”. O ponto de bate papo de todos os operários de construção da época. Trilha sonora: Jackson do Pandeiro e Almira, Marinês e sua Gente, e claro o Grande Luiz Gonzaga!

Aliás, foi na Praça Serzedêlo Correa (que era paraense, e foi governador do Paraná antes de ser prefeito do Distrito Federal) que eu ao mesmo tempo me sentí rejeitado por uma menina pela primeira vez, e ao mesmo tempo cometí a minha primeira gafe política. Minha família estava no Brasil há pouco mais de 2 anos e eu ainda me confundia muito com as palavras em português, como hoje me confundo com as palavras em húngaro. Eu tava brincando na pracinha e uma menininha linda estava distribuíndo uns papéizinhos. Eram cédulas de propaganda eleitoral para a eleição presidencial de 1950. A menininha chegou pra mim com as cédulas e me perguntou:

__Getúlio ou Brigadeiro?

Eu queria dar a resposta que ela quisesse, mas eu não sabia o que era um “getúlio”. Nem sabia que o “brigadeiro” ao qual ela se referia era o Brigadeiro Eduardo Gomes, um dos sobreviventes da Revolta dos 18 do Forte de 1922, um dos conspiradores que derrubaram Washington Luís, e pela segunda vez candidato à presidência da República pela UDN. Pra mim “brigadeiro” era talvez alguém que topava brigar e um “getúlio” seria o oposto? Ou talvez aquele doce gostoso de chocolate?

__Brigadeiro, respondí sorrindo e esperando um sorriso igual ao da meninha, e um daqueles papéizinhos!

Para a minha decepção, a menina botou a lingua pra fora e foi embora sem me dar o papel. Esquecí desta história por muito tempo e só voltei à me lembrar dela quando o Brigadeiro Eduardo Gomes foi um dos conspiradores do golpe militar de 1964. Mas continuei e continuo gostando do doce!

It's Valentine's Day

Apesar de muita gente achar que é apenas o “Dia dos Namorados” americano, o costume de romantizar 14 de fevereiro já aparecia em 1382 num poema de Geoffrey Chaucer comemorando o aniversário de noivado de Ricardo II da Inglaterra com Ana da Boemia.

“Pois isto aconteceu no dia de São Valentino,
Quando todas as aves vem escolher parceria”


Mas esta data já havia sido declarada como o dia do santo em 496 pelo Papa Gelásio I, até que em 1969 a Igreja Católica resolveu remover São Valentino do seu calendário oficial. Espertamente, o Dia dos Namorados no Brasil é 12 de junho, véspera do casamenteiro Santo Antonio que é bem mais seguro no calendário.

Claro que Al “Scarface” Capone tornou a data mais famosa em 1929 mandando metralhar 7 membros da gangue rival de George “Bugs” Moran numa garagem em Chicago, num ano em que o Chicago Bears venceu apenas 4 partidas e sofreu 9 derrotas. Mas não creio que Capone era muito ligado em futebol americano senão as vítimas seriam o técnico George Halas e seus jogadores.

Mas voltando ao romance do dia de hoje, ninguém tem sentimentos mais felizes do que as empresas de cartões, chocolates, jóias e presentes dos Estados Unidos que esperam uma renda de 13,7 bilhões de dólares como fruto do amor alheio.

Pessoalmente, eu acho que cada beijo que você der no seu namorado ou namorada (se você estiver namorando) é uma comemoração. E se você não estiver namorando, é um bom dia para lembrar o primeiro grande amor com um sorriso no coração. Ainda mais se você conseguir relembrar o brilho dos olhos amados. Mesmo se estiverem fechados.

Ou, se quiser muito, faça como as aves e vá tentar escolher parceria.